Choque

Sabe quando você chega em casa as quatro da manhã e não tem mais certeza de onde é o teto e onde é o chão? Fraca, tropeçando nos próprios pés. E é assim que eu estou. A camisa xadrez, as vezes grande e as vezes pequena demais, não consegue cobrir por completo o frio que sinto na varanda. A parede é fria, o vento é gelado e o meu corpo é quente o suficiente para ter um choque. É isso que estou buscando aqui. Em todo lugar, na verdade. Não necessariamente um choque de realidade. A realidade é amarga demais e uso dela apenas para necessidades básicas. O resto eu crio. Mas eu quero.

Eu quero um choque brusco.

Um choque de cultura. Quero ver prédios de vidro, pessoas cantando música irlandesa, quebrando pratos em casamentos, fazendo shows no parque.  Quero ver homens de saia, mulheres de terno, modelos carecas e com um piercing na boca. Mímicos pintados com tinta preta e branca, tacos de estrogonofe.

Um choque de consciência. Quero perceber que estive errada o tempo inteiro mas não quero que isso seja motivo de vergonha. As pessoas tem uma ideia tão estranha sobre o erro, como se fosse um pedido de humilhação. Queria me chocar com um lugar que não tivesse essa ideia.
Um choque de sentimentos. Ver que aquela pessoa que parecia ser um saco na verdade vale mais que a maior parte das pessoas que conheci na vida. O contrário também. É bom tomar na cara as vezes. Te torna mais focado e cuidadoso com suas escolhas.
Um choque de adrenalina. Adrenalina tão forte que parece que você vai morrer. Porque quando você vai morrer, vive mais. Sente mais. E eu sinto falta disso. É como não olhar pra montanha-russa voando enquanto está na fila. Não sente, só espera. Cansei de esperar. De parecer morta. Acorda.